28 de fevereiro de 2006

BACANAL




Quero beber! cantar asneiras
No esto brutal das bebedeiras
Que tudo emborca e faz em caco...
Evoé Baco!

Lá se me parte a alma levada
No torvelim da mascarada.
A gargalhar em doudo assomo...
Evoé Momo!

Lacem-na toda, multicores
As serpentinas dos amores,
Cobras de lívidos venenos...
Evoé Vênus!

Se perguntarem: Que mais queres,
Além de versos e mulheres?...
- Vinhos!... o vinho que é meu fracco!...
Evoé Baco!

O alfanje rútilo da lua,
Por degolar a nuca nua
Que me alucina e que eu não domo!...
Evoé Momo!

A Lira etérea, a grande Lira!...
Por que eu extático desfira
Em seu louvor versos obscenos.
Evoé Vênus!



Manuel Bandeira

23 de fevereiro de 2006

ÁS DE PAUS


Max Ernst

Uma pergunta pra você:

- Depois que o fogo apaga, para onde vai a chama?
........................................................................................
Sabe responder?
???
Bem, aí vai a cola:


"(...) a chama, dentre os objetos do mundo que nos fazem sonhar, é um dos maiores operadores de imagens. Ela nos força a imaginar. Diante dela, desde que se sonha, o que se percebe não é nada, comparado com o que se imagina. Ela traz consigo um valor seu, de metáforas e imagens, nos domínios das mais diversas meditações."
.....................................................................................
Bachelard, A Chama de uma vela, 1989.

18 de fevereiro de 2006

EU LUMINOSO NÃO SOU


Roberto Matta

Eu luminoso não sou. Nem sei que haja
Um poço mais remoto, e habitado
De cegas criaturas, de histórias e assombros.
Se, no fundo poço, que é o mundo
Secreto e intratável das águas interiores,
Uma roda de céu ondulando se alarga,
Digamos que é o mar: como o rápido canto
Ou apenas o eco, desenha no vazio irrespirável
O movimento de asas. O musgo é um silêncio,
E as cobras-d'água dobram rugas no céu,
Enquanto, devagar, as aves se recolhem.

José Saramago

(in PROVAVELMENTE ALEGRIA, Editorial CAMINHO, Lisboa, 1985, 3ª Edição)

p.s.: grata às minhas amigas tarólogas Janaina Leite e Erika Hirs pelo espontâneo auxilío com sugestões, perfeito para uma viajante um tanto atrapalhada. E que brilhe O Sol.

6 de fevereiro de 2006

O ENFORCADO




Pelas raízes do meu cabelo algum deus se apoderou de mim.
Fenvi em seus volts azuis como um profeta do deserto.

As noites caíram longe dos olhos como uma pálpebra de lagarto:
Um mundo de simples dias brancos numa órbita sem sombras.


Silvia Plath
tradução de Ronald Polito e Deisa Chamahum Chaves