Para ser Rainha do Lar, só sendo Rainha de Ouros - o arcano da corte mais próximo da Imperatriz. Partimos do princípio que o naipe de Ouros congrega todos os outros naipes, ou seja, a manifestação do Ar da Água e do Fogo, materializam-se na Terra de Ouros (ou na Terra de Marlboro), mas como isso é um depoimento e não um estudo, prometo me esforçar e manter o foco no que acontece comigo e aqui em casa.
Observem pelo caledoscópio. Lucy in the sky with diamonds. Ou Poikilóthron. Afrodite sentada no trono dourado lançando raios irisados para todos os lados. Porque é isso a mulher. Toda a diversidade.
Observem pelo caledoscópio. Lucy in the sky with diamonds. Ou Poikilóthron. Afrodite sentada no trono dourado lançando raios irisados para todos os lados. Porque é isso a mulher. Toda a diversidade.
Eu demorei muito para conseguir somar minhas Rainhas. Sou essencialmente Copas e finjo (bem) que sou Espadas (a Persona acaba grudando como sói acontecer com máscaras usadas repetidamente). E isso, obviamente, se reflete na minha forma de cuidar da casa e da família.
Minha Rainha de Paus é flutuante. Em períodos de energia equilibrada, o emocional também se estabiliza. Quando a força é excessiva posso usá-la a meu favor ou contra mim, na maior parte das vezes por processos inconscientes. Quando a uso a meu favor, meu coração se acalma e posso pensar em deixar minha casa bonita, em criar uma organização aprazível, em comer bem, em sorrir, em amar incondicionalmente. Relaxo em Copas quando a Rainha de Paus me favorece.
Se usar contra mim a força da Rainha de Paus, meus sentimentos entram em pane - o que só dá vazão a uma Rainha de Espadas mal-humorada. Uma chata. Rápida com as palavras e argumentos, pole position ou nada. Posso esquentar e fazer gritaria. Ou gelar tudo e virar a malvada Rainha das Neves. Melhor nem comentar... E nessa hora é recomendável que ninguém deixe nada fora do lugar. E eu repenso se devo ou não voltar para a Análise.
Agora, se a Rainha de Paus me falta, se a sua alegria se esvai, caio em tristeza e páro de comer. Fico meio sem graça. Isso se a Rainha de Copas, a menina sensível e sentimental e aquática for magoada. Disfarço ativando a máscara de Espadas (lembrem-se, ela é a Agua do Ar). Aí posso fingir que estou bem, coisa que não faço quando o pique é alto. Confesso que em certos momentos até gosto disso, gosto muito disso, a poesia conversa com a melancolia e ganho em transparência conversando com meus botões. A melancolia me apraz, não a dor. Nem a raiva. A intensidade logo me cansa. Copas, minha Água, se dá bem quando estou triste. E aí, fico suave. Nessas horas, a casa, materialmente falando, desaparece. É como se eu estivesse em outro mundo.
A verdade é que ando tão dona de casa, tão Housewives Tarot, tão brazilian way of life que tenho saudades de mim. Os poucos momentos de epifania são lavando a louça quando a bebê está dormindo ou passando o último produto anunciado pelos comerciais para deixar o chão branco da minha sala brilhando (a minha Rainha de Espadas é TOC total, seja na organização da casa, seja escrevendo). Fora isso, sempre são os Outros. E quando me dou conta já me esqueci entre as falas e os panos de prato.
Idealmente, poderia pagar para alguém para fazer o serviço doméstico que é repetitivo e invisível (para os outros). Você só fica realizada no momento em que a faxineira vai embora. Nos cinco minutos seguintes começa a repetir tudo, e assim vai, indefinidamente, queira ou não. Ninguém me ajuda na organização doméstica. Todos são bagunceiros. Minha Água entra pelo cano. Minhas Espadas são depostas. Sou melhor aqui, escrevendo. Fazendo o que faço agora.
Mas meninas, ao mesmo tempo... Estender roupas no varal pode ser uma atividade criativa (ironias a parte). O prazer em coar o café pela manhã é impagável. O panorama que avisto da minha casa, a enormidade de árvores, os pássaros (neste fim de semana, uma gralha-azul. Dias atrás, um tucano de bico verde)... Sim, há estética. Há beleza. E a beleza, sendo Copas, convulsiva ou relativamente ordenada pelas Espadas, é essencial. Luz. Não quero morar num apa(e)rtamento, que tantos falam ser mais simples. Por isso, esfrego a calçada se imprescindível. Mas não hesito em deixar que o jardim seja tomado por dentes-de-leão. Assopro a florzinha de vento e chamo por soluções. A Imperatriz é Mãe e A Sacerdotisa, bruxa.
Por falar em bruxas, alquimias só em momentos especiais e para minha bebê. Consigo escapar da ditadura alimentar. Me viro com nozes, saladas, azeites, grãos. Quem encosta o tanquinho no fogão é meu marido. Mas aí ninguém escapa das frituras, da maionese, de misturas incompreensíveis. Minha frugalidade não compreende o excesso. Claro que me preocupo com a manutenção do(s) tanquinho(s), mas não há outra saída. Se eu resolver cozinhar, não faço mais nada da vida.
A casa é uma empresa. E quem mantém essa empresa funcionando sou eu, a administradora de Ouros. Trabalhar em casa, trabalhar fora de casa, pagar as contas, dividir quando dá, marcar horas no médico, correr pra lá e pra cá, receber os amigos, fazer visitas, cuidar de três filhas, cada uma com suas particularidades e idades diferentes, dar comida para o cachorro, lembrar dos dias do lixo reciclável e do não-reciclável, escutar as mazelas do jardineiro, levar criança ara escola, pegar na escola, sacudir a mamadeira, apagar as luzes, conferir as portas, namorar e enfim dormir depois que todo mundo já está acomodado, não necessariamente nessa ordem mas quase isso. Socorro! Eu e outras mil donas-de-casa, míriades de mulheres espallhadas pelo mundo. Antigamente, nem tinhamos nossos nomes em lápides. Somos um arquétipo.
A verdade é que depois de bastante tempo consegui unir lá do meu jeito as Rainhas. Nunca estão bem equilibradas, é verdade, mas a variação faz a vida ficar colorida. Tons de vermelho vivo e verde-limão. Outra hora, cores delicadas. Ou o dia indo embora e tingindo de azul-incompreensível o céu.
Rainha de Ouros. Essa é a guria, essa é a dona da hora. Ela me cansa, não páro quieta. Ninguém mais me vê grudada no computador ou lendo deitada no sofá. Ou me arrumando para sair dançar. Em compensação tenho uma casa linda, três filhas lindas, um gato e um cachorro lindos. E o dia de hoje pra viver. Sem passado. Sem futuro. Só o espaço, aqui e agora.
A Inevitável Rainha de Ouros me obriga a relativizar. Respirar fundo. Avançar e retroceder. Alternar os meus humores e procurar não bailar ao sabor deles. Entender minha menina e minha velha. Ser generosa comigo. Ser exigente também. Lembrar da fada, lembrar da bruxa. Atender minhas consulentes com suas Rainhas embaralhadas. Aprender com as amigas as nuances do caledoscópio feminino que nunca, enquanto o mundo for mundo, deixará de nos surpreender.
Rainhas. Amar e amar e amar.
E quando dou sorte, um pouco de Poesia.
E quando dou sorte, um pouco de Poesia.
Zoe de Camaris
p.s.: esse post faz parte de uma blogagem coletiva proposta por Luciana Onofre e Pietra de Chiaro Luna.
p.s.: esse post faz parte de uma blogagem coletiva proposta por Luciana Onofre e Pietra de Chiaro Luna.