30 de outubro de 2005

CARTAS DE CIGARRO


Kali by Lynn Dewart

O Diabo mora nos detalhes, o inferno da analogia. Semelhanças icônicas e, porque não, irônicas – o nosso tempo, a Era de Kali. A deusa hindu da Destruição e do Renascimento nos mostra sua língua áspera. Eu fumo, você fuma? Fogo e Ar, os ritos da fumaça no fim dos tempos. Trazer a fogueira para perto de si, dizia uma amiga xamã - só pode ser o tal do xamanismo urbano.

Perto do fogo, eu quero estar perto do fogo.

O ato de fumar, segundo a antropóloga Vilma Chiara, é oferecer o sacrifício simbólico do corpo queimando lentamente - agradar aos deuses da Idade do Ferro, assim como Abraão agradou ao Senhor dos Desertos. Um rito de passagem. A supressão do ato de fumar indicaria que o rito foi levado a cabo. Fumantes são eternos adolescentes.



Como sabemos reproduzir gestos ! E como funciona bem a propaganda ... ao sucesso, com Hollywood.



O Tarot é essencialmente polissêmico. Uma história ilustrada em que podemos inserir leituras segundo nossa introvisão pessoal. Uma máquina de produzir sentidos a partir de investimentos múltiplos – culturais, sociais, afetivos. Há tempos, ouvi falar de uma agência que teria contratado tarólogos para auxiliar na resolução de uma campanha. Perspicazes, os publicitários. A comunicação imediata através do discurso com motivação metafórica e metonímica. Códigos. Só muda a matéria de expressão, o suporte. A matéria humana é sempre a mesma. E Kali continua morando nos detalhes.

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Sofro de um astigmatismo muito forte – quatro graus em cada vista. A lua que vejo no céu é dobrada. Meu mundo, sem óculos, não apresenta definições e limites exatos, uma imagem se funde com a outra e se desdobra. E num lance desses, há tempos, observei o verso de um maço de cigarros – a imagem de um homem sufocando, sem ar. Num primeiro momento, meus olhos não identificaram que o fundo da cena apresentava uma escada, não percebi a profundidade dos degraus. Me pareceram uma persiana.



Assim como a "persiana" que observamos ao fundo da lâmina de número 9 do naipe de Espadas no Tarot Waite. Inevitável mesmo foi traçar analogias. Ora, nos significados do 9 de espadas lemos o sofrimento, a agonia. O pesadelo que acomete a moça que tampa os olhos com suas mãos aflitas. Não há no pesadelo, no mais das vezes, a supressão repentina do processo respiratório? A Apnéia, Hipopnéia, o sufoco? São praticamente 9 os degraus na imagem do Ministério da Saúde. E na carta de Pamela Smith, o debrum do lençol ou os limites do colchão sugerem uma décima espada.















No livro O Natimorto, quadrinista Lourenço Mutarelli associa as cartas do tarot às nada agradáveis imagens dos maços de cigarro. Eu já tinha tido essa idéia - o produtor e dramaturgo Felipe Hirsh está de prova, já que uma noite lá em casa contei para ele sobre o quanto as imagens do verso das carteiras de cigarro se prestaria a um tarot degradado, ocasião em que Felipe me falou sobre o livro de Mutarelli, na época ainda não lançado.

Mutarelli relaciona o homem frente à escada ao Enforcado. E a imagem do casal na cama, que traz a advertência sobre a impotência sexual, ao arcano XVIII, A Lua, conforme se lê:

"Dois cães uivam enquanto bebem lágrimas lunares. Sob eles, um lençol de água. Na água, uma criatura, dizem, o escorpião. A Lua é cortada, e não vemos a parte superior. No maço, dois seres humanos. (...) Na parte inferior da imagem, um lençol cobre seus órgãos genitais. Na parede azul, como o céu, vemos ao centro um detalhe da moldura de um quadro que não vemos. A Lua."















O inferno das analogias. Não é o Diabo a sombra do Enamorado? Sempre precisando fazer escolhas. Inferno sem o qual um tarólogo não vive. E enquanto meu peito aguenta, acendo mais um cigarro. O Ministério da Saúde adverte ...e eu, me divirto. Enquanto posso.

Dedico mais este artigo para a taróloga Vera Tanka. Que fumou o quanto quis e não morreu disso. E trouxe, pra sempre, a fogueira perto de si.

Zoe de Camaris
out / 05

6 de outubro de 2005

Estudo para um Caos






O último anjo derramou seu cálice no ar.










Os sonhos caem na cabeça do homem,











As crianças são expelidas do ventre materno,











As estrelas se despregam do firmamento.










Uma tocha enorme pega fogo no fogo,










A água dos rios e dos mares jorra cadáveres.










Os vulcões vomitam cometas em furor










E as mil pernas da Grande dançarina









Fazem cair sobre a terra uma chuva de lodo.






Rachou-se o teto do céu em quatro partes:
Instintivamente, eu me agarro ao abismo.
Procurei meu rosto, não achei.
Depois a treva foi ajuntada à própria treva.





Poema de Murilo Mendes em As Metamorfoses (1944)
Tarot New Vision (exceto o Nove de Espadas de Waite/Smith)
Leitura de Zoe de Camaris


A PALAVRA É DE PRATA



O SILÊNCIO, DE OURO

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tudo imóvel - as horas nem respiram
num segundo a humanidade toda cala a boca
como se vendo através de vidraça fosca
o olhar de olhos que nunca viram

tudo em silêncio - o tempo parou para ouvir-se
perdida a memória, o real fica absurdo
qualquer coisa é a conclusão de tudo
o que se disse e o que não, agora diz-se


Marcos Prado (1961-1996)

1 de outubro de 2005

JOHN CHRISTOPHER Depp III

G A T O d e C O P A S




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G A T O d e P A U S




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G A T O d e E S P A D A S




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G A T O d e O U R O S




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Edward Mãos de Tesoura é uma primeira opção para Espadas, a mais óbvia, certamente. Dead Man, a mais acertada. A loucura de Mort Rainey em Janela Secreta também é de Espadas - os tormentos da mente - e Corso fica no mesmo naipe em O Nono Portal. Gato de Ouros como Wonka em A Fábrica de Chocolates, Paus em Piratas do Caribe e Copas em Chocolat.
tudo mais a declarar,

: )

Zoe