
Então, pra não deixar meus leitores sem o artigo de final de semana, recomendo o texto do Leonardo Chioda sobre o 2 de espadas - O Silêncio entre duas lâminas. Excelente! No Café Tarot.
"Deus, livra-me dos chatos!" - Dalton Trevisan
As imagens falam. Como estoy aburrida, não tenho muita vontade de tecer comentários, mas vamos lá. Prometo que farei o possível. E não me chateiem - lembrem-se! Eu moro em Curitiba, cidade onde tudo funciona. Céu azulzinho de outono, ônibus por um real que te leva aonde você quiser aos domingos (saco, hoje é domingo) - já abri as janelas faz tempo, já fiz café, já coloquei comida pro gatinho e pro cachorrinho... ó céus, ó vida, ó destino! Como é que o tempo ousa se arrastar desse jeito?
Bem. Calvin repete, na tirinha, o mesmo gesto do rapaz na imagem de Pamela Smith, do Universal Waite. Parece óbvio e é. A imagem do tédio - cruzar os braços em total empatia consigo mesmo já que nada do outro lado parece funcionar de agrado. Tudo uniforme, a expressão da indiferença. Tédio inclui ironia, algumas vezes cinismo. O mundo pode cair que você não está nem aí. Mas, com certeza, ele não cairá. Faz parte do tédio a desesperança. Digamos que o tédio não é grave como a angústia. Na angústia, há movimento. No tédio, tudo pára de fazer sentido. E há uma inflação egóica, claro. O entediado é um príncipe, cansado de suas riquezas e dos cachorros de raça que o distraem, vez ou outra. Tédio é para poucos, digamos assim. Há uma nobreza no tédio que é típica daqueles que são excessivamente mimados. E que pode ser confundido com "estilo".
Causa, inclusive, a exasperação alheia. Sim, os chatos que não se cansam de repetir: - mas olhe como a vida é linda! Humpft. Tédio. Aqui, não se toma conhecimento do que a vida, generosamente, entrega. Nenhuma gratidão. Certo mesmo está é o Olavo Bilac, outro porre: "Sobre minh'alma, como sobre um trono,/ Senhor brutal, pesa o aborrecimento./ Como tardas em vir, último outono,/ Lançar-me as folhas últimas ao vento!".
Se fosse tédio mesmo, o poema não teria tantas exclamações. Aliás, como o tédio tem a ver com uma certa preguiça, os marcadores sem dúvida seriam as reticências.
Tremenda mesmice. Um bocejo imenso vai engolir o mundo. Nada do que lhe é oferecido faz alguma diferença. A palavra-chave é indiferença. Vantagens? Sim. Para Baudelaire, de quem acabei de roubar a frase do bocejo, o esvaziamento da dimensão simbólica da existência seria uma necessidade para a subversão crítica da realidade. Mas esse ensaio que estou lendo é um saco, passemos a algo menos chato, senão, que nem a Rê Bordosa, vou estourar de tédio junto com meus leitores que, a essas alturas, espero, já tenham fechado a janela. Ninguém merece esse texto. Não hoje.
E dêem graças a deus os que estão vivos, porque acabei de achar um poema de J.G. de Araújo Jorge perfeito para o momento e aí então, não sobraria pedra sobre pedra. Vou poupá-los de tamanho aborrecimento.
Ai ai. Voltemos então ao Tarot. Crowley agora. Se você ainda estiver de olhos abertos, observe a imagem:
O nome da carta é Luxúria. Exuberância. Hum? Lúxuria é bom? É, né? Dizem que é, não sei. Parece que a palavra "luxúria" dentro do contexto crowleyano quer dizer mais coisas, tem seu sentido estendido. Excesso de prazeres. No meu caso, excesso de chocolates.
E quando há exagero, obviamente, há tédio. Faz parte da natureza humana "sentir falta". Se algo não me falta, se não me falta nada, o estado é de prostração. Hazo Banhaf é bacana ao interpretar a carta. Bonzinho. Eu prefiro as aulas do Veet Vivarta em que a seguinte expressão reveladora nunca mais me saiu da cabeça: "amor de grude". A Lua está em Câncer, o que equivale a dizer que está em casa. Mas tem coisa mais chata que a Lua em Câncer e em casa? Chicletes. Amor & chicletes. Gente que fica abraçando e beijando o tempo todo, telefonando, dizendo que ama, agarrando no pescoço. Eu não gosto de melação - há quem goste, claro. Minha Lua é clean, virginiana. Carinho é bom. Pegação no pé é um saco.
Há um conformismo que pode significar conforto. Bem dignificada, a carta significa ternura, aceitação do amor entregue. Você está sendo mimado. Cuidado (nos dois sentidos). É claro que para que isso resvale no ciúme, no zelo excessivo, é apenas um pequeno passo.
A seqüência explicita: Ás de Copas - transbordamento amoroso como estado inicial; Dois de Copas - amor compartilhado; Três de Copas - festa, amor vivaz, lua-de-mel; Quatro de Copas - cansaço (depois do orgasmo?) seguido de tédio e do...Cinco de Copas, claro, desapontamento.
Outro dia, li numa comunidade sobre Tarot que o 4 de copas poderia significar traição. Sorri com o canto da boca. A "traição" está é no 3 de copas. No quatro, só há acomodamento.
As nuvens no fundo da lâmina começam a ficar escuras. Nimbus recheada. O tédio é cinzento como uma tarde de domingo.
Ok, vou parar de cansar vocês e almoçar na casa da minha mãe. Se eu der sorte, não vai ter macarrão. Mas eu SEI que vai ter macarrão.
Zoe de Camaris