3 de dezembro de 2006

Sobre Profecias (APOLLINAIRE)




Conheço umas profetisas por aí
Madame Salmajour aprendeu na Oceania a arte da taromancia
Foi lá também que teve a chance de participar
De uma deliciosa cena de antropofagia
Claro que ela não espalhou pra todo mundo
Mas sobre o futuro nunca errava uma

Uma cartomante ceterana* Margarida etcetera e tal
É talentosa também
Mas já Madame Delroy é mais inspirada
Mais precisa
Tudo que disse sobre meu passado era verdade e o que ela
Predisse no tempo aconteceu no tempo que indicou
Conheço um sciomântico* mas não queria que interrogasse minha sombra
Conheço um adivinhador de água o pintor norueguês Diriks
Espelho quebrado banho de sal migalhas de pão
Que esses deuses sem figura sempre me poupem
E ao mesmo tempo não acredito mas olho e reparo
Acho que leio mãos muito bem
Pois não acredito mas mesmo assim reparo e escuto e olho

Todo mundo é profeta caro amigo André Billy
Mas por tanto tempo as pessoas foram levadas a crer
Que não tinham futuro e ficariam pra sempre ignorantes
E idiotas de nascença
Que eles acabam se resignando e nunca mais ninguém se lembra
De especular sobre se ele conhece ou não o futuro
Não tem nada de religioso nisso

Nem nas superstições nem nas profecias
Nem em nada que as pessoas chamam de ocultismo
O que existe acima de tudo é um jeito de observar a natureza
De interpretar a natureza
Que é completamente legítimo



Guillaume Apollinaire
Tradução: Rodrigo Garcia Lopes



* Nascida em Céter, (nos Pirineus orientais). De Ceretani, "antigo povo da Espanha, da Terraconaise, ao pé dos Pirineus".
* Forma primitiva de necromacia, relativo à adivinhação através de comunicação com as sombras (espíritos) dos mortos; também relacionado com a evocação de reflexos astrais para adivinhar eventos futuros.


Um comentário:

Anônimo disse...

Grande Apollinaire! :)